Suspeito de matar delegada na Bahia confessa que usou cinto de segurança contra o pescoço dela e inventou versão de sequestro
O homem suspeito de matar a delegada Patrícia Neves Jackes Aires confessou o crime e disse que inventou a versão que os dois teriam sido sequestrados. Tancredo Neves falou à polícia que "girou o cinto de segurança no pescoço dela" para se defender de agressões durante uma discussão.
A declaração de Tancredo Neves foi dada em depoimento, nesta segunda-feira (12), na 37ª Delegacia Territorial da Bahia (DT/São Sebastião do Passé).
A mulher foi encontrada morta no domingo (11), dentro do próprio carro, em uma área de mata em São Sebastião do Passé, cidade na Região Metropolitana de Salvador. Para a Polícia Civil, Tancredo Neves, de 26 anos, companheiro dela, é o principal suspeito do feminicídio.
A Polícia Civil da Bahia investiga as causas da morte da delegada. Há a suspeita de que a vítima tenha sido estrangulada.
Na primeira versão, Tancredo relatou que por volta de meia-noite de domingo, os dois teriam saído de Santo Antônio de Jesus com destino a Salvador e quando fizeram uma parada na rodovia, teriam sido abordados por três indivíduos em uma motocicleta.
Ele foi preso em flagrante e afirma que os dois foram vítimas de um sequestro. Após passar por audiência de custódia, Tancredo teve a prisão em flagrante convertida em preventiva, nesta segunda.
Em novo depoimento, Neves detalhou como tudo aconteceu durante a noite do ocorrido. O suspeito contou que os dois saíram para beber, em Santo Antônio de Jesus, e Patrícia teria ficado alcoolizada.
Em seguida, disse que na saída do estabelecimento, a delegada teria decidido viajar para Salvador para comprar roupas. O homem relatou que durante a viagem, eles pararam para urinar e seguiram viagem. Ele contou que quando passaram por um pedágio, disse para a mulher que os dois precisavam repensar a relação.
Neste momento, segundo Tancredo, Patrícia se descontrolou, disse que iria matar a família e a filha dele e puxou o volante do carro, provocando a batida em uma árvore.
Conforme relato do suspeito, Patrícia começou a bater, ele girou o cinto de segurança no pescoço dela e começou a enforca-la, com o objetivo de fazer a mulher parar. Segundo ele, o objetivo não era matar a delegada.
O homem ainda disse que após cerca de 40 segundos notou que Patrícia estava desacordada, saiu do carro e chamou a polícia. Conforme Neves, ele não sabia que a mulher estava morta.
O suspeito disse que decidiu inventar a versão do suposto sequestro por "medo" e após pensar, decidiu contar a verdade. Falou ainda que se arrepende do que aconteceu. Ele também afirmou que a mulher "nunca saía armada e na noite do ocorrido não foi diferente".
Tancredo Neves ainda relatou que iria se casar com a chefe de polícia na próxima quarta-feira (14), apenas três dias após ela ter sido assassinada. O homem contou que conheceu Patrícia em novembro de 2023, em um restaurante de Santo Antônio de Jesus, no recôncavo baiano. A delegada atuava como plantonista na unidade policial da cidade.
O relacionamento, segundo ele, teve início há cerca de quatro meses. O homem admitiu que houve agressões verbais ao longo desse período, mas negou que tenha ocorrido qualquer episódio de violência física ou sexual.
Apesar disso, ele chegou a ser preso em flagrante maio deste ano por agressão contra Patrícia. Neves argumentou que provou sua inocência no caso e ressaltou que a vítima retirou a medida protetiva de urgência. Ele foi solto por decisão judicial e o casal se reconciliou.
Tancredo também relatou que nesta ocasião, Patrícia caiu sozinha e quis terminar a relação.
Queixas de outras mulheres e exercício ilegal da Medicina
Antes de se relacionar com a delegada, Neves já colecionava denúncias e processos apresentados por outras mulheres com as quais se relacionou. Em todos os casos, ele nega as agressões.
Questionado sobre o que explicaria o fato de "tantas mulheres terem registrado fatos" contra ele, o homem alegou apenas que "xinga muito".
O investigado também é alvo de um inquérito por exercício ilegal da Medicina. Neves reconheceu a existência do processo, contudo, nunca foi intimado, conforme ele. O homem se apresenta como médico, formado no Paraguai, mas disse que não exerce a profissão.
Os indiciamentos por exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica aconteceram depois que a Polícia Civil de Euclides da Cunha concluiu as investigações em 2022. Os documentos foram remetidos ao Ministério Público da Bahia (MP-BA).
Por meio de nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) informou que não há nenhum médico registrado com o nome de Tancredo Neves Lacerda Feliciano de Arruda.
Quem era Patrícia Jackes
Patrícia Neves Jackes Aires, de 39 anos, nasceu em Recife, capital pernambucana, e tinha um filho. Bacharel em Direito e especialista em Direito Penal e Processo Penal, a delegada tomou posse em 2016, sendo designada em seguida para a delegacia de Barra, no oeste da Bahia.
Depois, comandou as delegacias de Maragogipe e São Felipe, antes de ser lotada em Santo Antônio de Jesus, onde atuava como plantonista.
Patrícia Jackes tinha forte atuação na prevenção e enfrentamento às violências de gênero. Em 2021, ela passou pelo Núcleo Especializado de Atendimento à Mulher (NEAM), da 4ª Coordenadoria de Polícia, no município de Santo Antônio de Jesus (BA).
Antes de se formar em Direito, Patrícia se graduou em Licenciatura Plena em Letras. Ela trabalhou por 12 anos como professora de língua portuguesa e língua inglesa.
Por Monica Melo, g1 BA e TV Bahia