29/08/2024 às 17h09min - Atualizada em 29/08/2024 às 17h09min
Operação Faroeste: TJ-BA desembolsa mais de R$ 2 milhões em 2024 com salários de desembargadoras afastadas


De janeiro a julho de 2024, o judiciário estadual gastou mais de R$ 2 milhões com o pagamento de remuneração de cinco desembargadoras da ativa, alvos da Operação Faroeste e afastadas das funções por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O levantamento foi feito pelo BNews com base em dados do Portal da Transparência do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA)

Desde 2019, no âmbito da Operação Faroeste, que investiga um esquema de corrupção envolvendo a venda de decisões judiciais em processos de disputa de terras na região oeste da Bahia, oito desembargadores e três juízes estão sendo investigados e foram afastados dos cargos. 

Os magistrados são Maria do Socorro Santiago, Ligia Maria Cunha, Sandra Inês Rusciolelli, Cassinelza Lopes, Ilona Márcia Reis, Gesivaldo Britto, Maria da Graça Osório e José Olegário Caldas.

As quatro primeiras continuaram na ativa em 2024 e os quatro últimos se  aposentaram no curso das investigações, sendo Ilona Márcia Reis a última a entrar na inatividade, em julho deste ano. 

Dos oito desembargadores, Maria do Socorro Santiago e Gesivaldo Britto já ocuparam a presidência do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Inclusive, Gesivaldo, quando foi afastado, em novembro de 2019, ainda estava no mais alto cargo de comando do tribunal. 

Todos foram afastados das funções e proibidos de acessar as dependências e os sistemas eletrônicos do TJ-BA para que não atrapalhassem as investigações, não mantivessem contato com outros investigados e para que não tentassem destruir provas e obstruir a justiça.

Entretanto, mesmo impedidos de exercerem suas funções, todos os desembargadores continuaram recebendo mensalmente a remuneração do cargo, já que a decisão do STJ não determinou a suspensão dos pagamentos, uma vez que, como ainda não há condenação, vale o princípio da presunção de inocência. Ou seja, até que se prove o contrário, o magistrado é inocente e não pode sofrer consequências remuneratórias.

Na decisão que afastou Gesivaldo Britto, Maria da Graça Osório e José Olegário Caldas, o relator da Faroeste no STJ, ministro Og Fernandes, citou a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, a Lei de Organizações Criminosas e o Código de Processo Penal para alegar que é possível o afastamento cautelar de magistrado do exercício das suas funções sem que haja a suspensão da remuneração e das vantagens, até a decisão final. Esse mesmo entendimento foi utilizado nas decisões que afastaram os demais desembargadores.

Gesivaldo Britto, Maria da Graça Osório e José Olegário Caldas se aposentaram antes do início de 2024, de forma compulsória, por terem atingido a idade limite de 75 anos. Após a aposentadoria, o TJ-BA passou a pagar aposentadorias para eles. 

 

Já Maria do Socorro Santiago, Ligia Maria Cunha, Sandra Inês Rusciolelli, Cassinelza Lopes e Ilona Márcia Reis, na ativa, mantiveram seus pagamentos mensalmente durante este ano. Ilona se aposentou em julho, também de forma compulsória, em razão da idade. Com isso, o tribunal desembolsou R$ 2.006.381,90 (dois milhões seis mil trezentos e oitenta e um reais e noventa centavos) com a folha de pagamento das magistradas entre janeiro e julho de 2024.

Maria do Socorro Santiago

A ex-presidente do Tribunal de Justiça da Bahia está afastada desde dezembro de 2019 e chegou a ser presa ainda no mesmo ano, na primeira fase da Operação Faroeste, por suposta prática de  corrupção passiva e lavagem de dinheiro por meio do envolvimento em venda de decisões judiciais e grilagem de terras no oeste da Bahia.

A magistrada já tentou retornar ao cargo por diversas vezes apresentando recursos ao Superior Tribunal de Justiça com pedidos de derrubada de seu afastamento, mas nenhum foi atendido.

Desde dezembro de 2019, mesmo afastada, Maria do Socorro segue recebendo sua remuneração mensal. Somente em 2024, de janeiro a julho, ela recebeu R$ 405.926,00 (quatrocentos e cinco mil novecentos e vinte e seis reais) brutos e R$ 295.950,74 (duzentos e noventa e cinco mil novecentos e cinquenta reais e setenta e quatro centavos) líquidos. 

Ligia Maria Cunha

A desembargadora foi presa em 14 de dezembro de 2020, durante a sexta fase da Faroeste. No dia 15, o STJ converteu a prisão temporária de Ligia Maria Cunha em domiciliar, porque ela se recuperava de uma cirurgia realizada dias antes. Em 20 de dezembro do mesmo ano a prisão temporária foi convertida em preventiva e no dia seguinte ela foi transferida para um presídio no Distrito Federal.

Em junho de 2021, Og Fernandes, relator da Faroste no STJ, revogou a prisão da desembargadora e aplicou medidas cautelares, como o afastamento do cargo, a proibição de comparecer ao TJ-BA e de manter contato com os demais investigados.

Ligia é investigada pela possível prática de crimes como corrupção, organização criminosa e lavagem de capitais.

De janeiro de julho de 2024, igualmente a Maria do Socorro Santiago, a magistrada recebeu R$ 405.926,00 (quatrocentos e cinco mil novecentos e vinte e seis reais) brutos e R$ 295.950,74 (duzentos e noventa e cinco mil novecentos e cinquenta reais e setenta e quatro centavos) líquidos. 

 

Sandra Inês Rusciolelli

Em março de 2020, Sandra Inês Rusciolelli foi presa e afastada do cargo durante a quinta fase da Operação Faroeste, também por envolvimento no esquema de venda de decisões judiciais para grilagem de terras no interior do estado.  Na época, dois advogados também foram presos, sendo um deles filho de Sandra, Vasco Rusciolelli, apontado como operador financeiro do esquema. Em setembro do mesmo ano os dois deixaram a prisão, mas continuaram presos em domicílio.

Em outubro de 2021, o Superior Tribunal de Justiça revogou a prisão domiciliar da desembargadora e do filho dela, mas manteve o afastamento do cargo. Ela firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal (MPF) e que foi homologado ainda em 2021 pelo STJ .

 

m sua delação, Sandra Inês afirmou que recebeu ameaças de morte e que era coagida a dar decisões favoráveis aos outros desembargadores envolvidos no esquema. 

Os totais de R$ 428.733,53 (quatrocentos e vinte e oito mil setecentos e trinta e três reais e cinquenta e três centavos) e R$ 319.137,42 (trezentos e dezenove mil cento e trinta e sete reais e quarenta e dois centavos) foram os montates, bruto e líquido, respectivamente, recebidos pela desembargadora em 2024 até o momento. 

Cassinelza Lopes

Cassinelza Lopes, que foi promovida ao cargo de desembargadora em novembro de 2022 pelo critério da antiguidade, foi afastada um ano após a posse, em novembro de 2023

Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determinou o afastamento e também a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), há indícios de um possível conluio entre a magistrada, um promotor de Justiça e os autores de uma ação referente a usucapião de uma fazenda no interior da Bahia, quando, ainda como juíza de primeiro grau, ela atuou na comarca de São Desidério. 

A decisão proferida nesse processo é investigada pela Operação Faroeste.

Um fato curioso sobre a desembargadora é que ela foi designada para atuar na comarca de São Desidério, onde a decisão suspeita foi dada, pelo ex-presidente do TJ-BA, Gesivaldo Britto, também afastado por suposto envolvimento no mesmo esquema. Meses depois, em novembro de 2019, quando ainda não se sabia do seu possível envolvimento, foi convocada pelo então presidente da corte baiana, Augusto Lima Bispo, que era vice-presidente e assumiu o posto com o afastamento de Gesilvaldo, para atuar no lugar do desembargador José Olegário Monção Caldas, também impedido de exercer as funções no âmbito da mesma operação. 

Em 2024, de janeiro a julho, Cassinelza Lopes recebeu R$ 414.208,49 (quatrocentos e catorze mil duzentos e oito reais e quarenta e nove centavos) e R$ 303.798,21 (trezentos e três mil setecentos e noventa e oito reais e vinte e um centavos), brutos e líquidos, respectivamente, mesmo sem trabalhar. 

Ilona Márcia Reis

Investigada por supostamente receber 800 mil reais de propina pela venda de decisões em três processos relacionados a imóveis no oeste baiano, a desembargadora Ilona Márcia Reis foi afastada do cargo em dezembro de 2020, quando foi alvo da Faroeste. Ela também chegou a ser presa

Em junho deste ano, pouco antes de se aposentar, ela se tornou ré no STJ por associação criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.  

No último dia 15 de julho, Ilona foi aposentada compulsoriamente, em razão da idade (75 anos), por um decreto assinado pela atual presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, desembargadora Cynthia Maria Pina Resende

De janeiro a julho deste ano, Ilona Márcia Reis recebeu R$ 351.587,88 (trezentos e cinquenta e um mil quinhentos e oitenta e sete reais e oitenta e oito centavos) brutos e R$ 241.612,62 (duzentos e quarenta e um mil seiscentos e doze reais e sessenta e dois centavos). 

Entre janeiro e julho de 2024, conforme dados do Portal da Transparência do Tribunal de Justiça da Bahia aos quais o BNews teve acesso, o judiciário baiano desembolsou mais de R$ 2 milhões com o pagamento de remuneração das desembargadoras. 

Esse total gasto diz respeito, apenas, aos desembargadores afastados que estão na ativa, ou seja, que até julho ainda não tinham se aposentado. Os valores variam entre os magistrados e os meses por conta do recebimento de indenizações de férias, licença prêmio e outras vantagens.

Em relação a Gesivaldo Britto, Maria da Graça Osório e José Olegário Caldas, todos também continuam recebendo valores mensais, que não foram contabilzados neste levantamento, entretanto relativos à aposentadoria, o que irá ocorrer a partir deste mês de agosto com Ilona Márcia Reis que se aposentou em julho. 

 

Lucas Pacheco - Bn@ws

 

 
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