Fim da prisão após segunda instância pode tirar 22 mil da cadeia
De acordo com dados do Painel do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que foram levantados pelo Estado de Minas/Correio Braziliense, o número de presos provisórios, ou seja, que ainda não foram julgados em última instância, chega a 22 mil em um universo de 130 mil que estão cadastrados.
Quando se fala em prisão em segunda instância, logo vem ao pensamento dos brasileiros os réus da Lava-Jato, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Antonio Palocci. Mas eles estão acompanhados de pessoas condenadas por homicídio, tráfico e porte de drogas, estelionato, estupros, entre outros.
Se a maioria dos ministros decidir revogar o entendimento sobre o assunto que prevalece desde 2016, esses detentos ganham o direito a aguardar o processo em liberdade, até que eventuais recursos sejam julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O especialista José Vicente da Silva, coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo e ex-secretário Nacional de Segurança, alerta que a liberação de presos pode elevar a sensação de impunidade e piorar o quadro de violência que atinge o país.
“Quem estuda e trabalha com segurança, sabe que a resposta à violência é fundamental para determinar a eficiência das ações. Se o STF proibir a prisão após segunda instância, vai enfraquecer o combate ao crime, não só aos envolvidos na Lava-Jato, mas a toda espécie de infrator. Vai aumentar a sensação de impunidade na sociedade e transferir para a polícia, ainda mais, a carga de manter a ordem e a segurança”, afirma o coronel.
Em 2016, quando o STF decidiu que a prisão após segunda instância é constitucional, cerca de 3.600 condenados foram presos de forma imediata. A decisão foi tomada durante o julgamento de liminares apresentadas em duas Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs). Uma dessas ações é a ADC 43, apresentada pelo Partido Ecológico Nacional (PEN). Essa é a mesma que deve ser analisada novamente, em caráter liminar.
O ministro Marco Aurélio Mello informou que vai levar o assunto à presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, para que seja colocado em pauta no plenário da Corte. Na quarta-feira passada, o ministro deu prazo de cinco dias para que os novos advogados do PEN analisem a ação.
O advogado do partido deve defender a não aprovação da proposta, ou a autorização de prisão quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) analisar o primeiro recurso que pode ser apresentado na corte. Após o assunto gerar polêmica, os dirigentes da legenda optaram em não apoiar a proposta. No entanto, de acordo com a legislação, não é mais possível desistir da ação.
No último dia 4, o Supremo negou habeas corpus do ex-presidente Lula com base no entendimento de que é possível o início da execução da pena após condenação criminal em segunda instância. A decisão foi tomada com maioria apertada, 6 a 5, e com sinalização de mudança de entendimento caso seja votada ação direta de constitucionalidade sobre o tema.
De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça, a população carcerária atual do Brasil é de 726 mil detentos, distribuídos em 1.437 centros de reclusão, entre presídios, centros de medidas socioeducativas, carceragens, centros de prisões provisórias, galpões e cadeias públicas.
O número de condenados beneficiados com a medida pode ser ainda maior. Pois não existe um levantamento geral sobre a situação de todos os detentos. Esses dados estão sendo computados pelo CNJ. Mas apenas os estados do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro implantaram um sistema eletrônico que monitora em tempo real a situação dos condenados pela Justiça, foragidos e pessoas que estão presas provisoriamente.
DEBATE NA CÂMARA
A chamada antecipação de pena ficou proibida entre 2009 e 2016. Nesse período, o tema rendeu debates entre especialistas de segurança, advogados, magistrados e procuradores. Após a operação Lava-Jato, que teve a primeira fase deflagrada em 2014, mirando políticos e empresários, a polêmica ganhou ainda mais força. Procuradores do Ministério Público, delegados e juízes afirmam que uma infinidade de recursos e a lentidão dos tribunais de última instância impedem a aplicação da lei.Já entre os advogados da área penal, a acusação é de que a prisão antes do trâmite em julgado viola o princípio da presunção de inocência, previsto na Constituição Federal. Na Câmara dos Deputados, tramita uma proposta que pode dar um fim definitivo para o assunto. De autoria do deputado Alex Manente (PPS-SP), a Proposta de Emenda à Constituição 410/2018 pretende autorizar de vez a prisão após o encerramento do caso nos Tribunais Regionais Federais (TRFs).
Enquanto houver intervenção federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro nenhuma PEC pode ser votada no Congresso Nacional, mas o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), já informou que a Casa vai discutir a proposta de Manente sobre a possibilidade de prisão em segunda instância. Na ocasião,
Maia não quis expor sua posição pessoal, sob justificativa de que poderia aparentar uma interferência em futuras decisões no STF. A ideia, de acordo com ele, é deixar a matéria pronta para votação em plenário assim que a intervenção acabar. A previsão inicial é que isso aconteça somente no fim do ano. (Com agências)