Paulo Coelho comenta suspeita de que Raul Seixas o entregou à ditadura
O escritor Paulo Coelho comentou nesta quarta-feira, 23, a notícia revelada em reportagem da Folha de S. Paulo sobre uma possível traição de Raul Seixas. Segundo matéria do jornal sobre o livro Raul Seixas: Não Diga que a Canção Está Perdida, de Jotabê Medeiros, o músico é suspeito de ter entregado Coelho aos militares durante a ditadura.
“Fiquei quieto por 45 anos. Achei que levava segredo para o túmulo”, disse Coelho no Twitter sobre a revelação. Em seguida, ele amenizou a declaração. “Não confirmei e não confirmo nada. Eu apenas vi o documento e me senti abandonado na época.”
Segundo Medeiros, em maio de 1974, Seixas foi convocado para dar um depoimento no Departamento de Ordem Política e Social (Dops), e ligou para o colega, pedindo que o acompanhasse. A dupla havia lançado no ano anterior o disco Krig-ha, Bandolo! e a conversa com as autoridades girou em torno das músicas feitas por eles.
Em entrevista à Folha, o autor da biografia diz que Raul Seixas já havia ido ao Dops poucos dias antes de retornar com Coelho – que depois foi detido e torturado por duas semanas.
Em artigo publicado no The Washington Post este ano, Coelho narra o episódio. Segundo ele, sua casa foi invadida no dia 28 de maio de 1974 para ser levado ao Dops, ser fichado e fotografado. Liberado pouco depois, pegou um táxi. O carro foi fechado por outros dois carros e ele foi tirado de lá por homens armados. Foi encapuçado e apanhou no carro. Quando permitiram que ele tirasse o capuz, se deu conta de que estava numa sala a prova de som com marcas de tiro nas paredes. A tortura seguiu. Veja um trecho a seguir:
“Depois de não sei quanto tempo e quantas sessões (o tempo no inferno não se conta em horas), batem na porta e pedem para que coloque o capuz. (…) Sou levado para uma sala pequena, toda pintada de negro, com um ar-condicionado fortíssimo. Apagam a luz. Só escuridão, frio, e uma sirene que toca sem parar. Começo a enlouquecer, a ter visões de cavalos. Bato na porta da ‘geladeira’ (descobri mais tarde que esse era o nome), mas ninguém abre. Desmaio. Acordo e desmaio várias vezes, e em uma delas penso: melhor apanhar do que ficar aqui dentro.”
Paulo Coelho deu todos os detalhes sobre o que sofreu e contou ainda que anos mais tarde, quando os arquivos da ditadura foram abertos, ele teve a chance de saber quem o denunciou, mas não quis. “Não vai mudar o passado”, disse.